Grupo de pesquisa da USP lança livro sobre arranjos econômicos de jornalismo

por: Luana Machado


O
Centro de Pesquisa Comunicação e Trabalho da USP lançou no dia 2 de dezembro seu terceiro livro publicado, o e-book “Arranjos jornalísticos no Brasil”.

A publicação surgiu de quase uma década de estudos sobre as novas organizações e perfis dos jornalistas brasileiros. 

Cadastrados no CNPQ e com apoio da Fapesp, o CPCT desenvolveu vários projetos alinhados à proposta de discutir o binômio comunicação e trabalho.

As últimas três pesquisas desenvolvidas pelo grupo envolvem o estudo dos novos arranjos de trabalho no mundo, na América Latina e no Brasil. As duas primeiras são pesquisas realizadas em redes e com parcerias de universidades estrangeiras. 

“Atualmente, atuamos nessas três pesquisas simultâneas. A rede nacional é sobre o perfil do jornalista brasileiro, coordenado pelo professor Samuel Lima da Universidade de Santa Catarina, que nós participamos como centro de estudos parceiros. A outra é internacional, coordenada pela Universidade de Oxford, que é chamada Fair Work, e é sobre os princípios justos para o trabalho plataformizado”, conta Roseli Fígaro, coordenadora do CPCT e professora de Educomunicação na ECA-USP.

O estudo do perfil e arranjos jornalísticos foi desenvolvido desde o final de 2006 e gerou uma série de três livros, sendo o último o lançamento de dezembro. 

O conceito de arranjos surgiu da necessidade de um amparo conceitual que caracterizasse essas iniciativas que querem fazer um jornalismo diferente da mídia tradicional.

“Quando nós começamos a fazer o levantamento desses novos veículos de comunicação, poderíamos usar um discurso pronto e falar que eles são inovadores, que são empreendedores ou startups. Mas tudo isso tem uma definição específica e quando fomos estudá-los o que o levantamento mostrou é que eles não se identificam assim”, relata Roseli.

A partir disso, o grupo buscou um termo que fosse apropriado a essa perspectiva de desenvolvimento econômico local, voltado a uma expertise específica: o jornalismo.

“Esse termo que vem de teóricos italianos e foi apropriado no Brasil vem de uma perspectiva de desenvolvimento de cadeias produtivas locais em torno de determinada temática. Então, adaptamos ele para chamar atenção para a realidade do jornalismo, porque esses arranjos nada mais são que uma tentativa de organizar localmente e economicamente uma força produtiva que existe e o mercado não quer saber dela, porque a lógica é a precarização”, afirma a professora. 

A pesquisa consistiu em um extenso levantamento de dados sobre 170 arranjos de trabalho de jornalistas no Brasil.

E foi composta por duas etapas: a primeira de mapeamento dos 170 arranjos e aprofundamento em 70 deles, a partir de uma análise de como se organizam, como se sustentam, como atuam as equipes e o perfil socioeconômico dos trabalhadores. Já a segunda fase analisou o jornalismo produzido por essas organizações.

Segundo Roseli, esse trabalho foi encerrado com o último livro lançado dia 2, no qual foi estabelecida uma rede de pesquisadores no Brasil para identificar os novos arranjos jornalísticos em cada estado.

O trabalho foi extenso, tendo em vista que a pesquisa tinha um caráter exploratório. O estudo se orientou a partir da chamada técnica “bola de neve”, na qual a partir de uma fonte inicial, denominada “semente”, os pesquisadores vão sendo direcionados a novas fontes e informações até compor uma rede grande o suficiente para validar os dados. 

“Nós conseguimos nessa técnica mapear 170 arranjos a partir da Agência Pública que publicou um mapa de agências independentes em 2015, fomos lá falar com eles e então criamos uma grande planilha a partir desses dados e do que os grandes sites Facebook, Twitter, nos informavam”, relembra Roseli. 

Depois eles categorizaram os perfis dessas organizações e criaram seis grandes categorias: jornalismo hard news, jornalismo de ativismo, das causas sociais, de gênero, mercadológico, e interpretativo.

Com isso, foram selecionadas amostras de cada grupo e realizadas entrevistas em profundidade com elas. A conclusão foi um panorama de inovação dentro do mundo do jornalismo.

A maior parte dos jornalistas envolvidos nesses arranjos são recém saídos da faculdade ou profissionais com muita experiência, ambos com paixão pelo jornalismo e empenhados em trabalhar fora do circuito da grande mídia. 

Porém, esses profissionais encontram dificuldade para sustentar seus novos modelos de negócios.

Muitos têm outros tipos de trabalho para fazer o jornalismo que gostam, ou sustentam os projetos a partir de crowdfunding, as vaquinhas nas redes, ou até mesmo de projetos de financiamento internacionais e vendem serviços como cursos, palestras e assessorias. 

Outra característica encontrada é a diversidade de temáticas abordadas, que vão desde a questão da ecologia até o turismo e as questões sociais e políticas.

Por isso, durante o processo de perfilar os produtos desenvolvidos pelos arranjos foi difícil para o centro caracterizá-los dentro dos conceitos padrão de linhas editoriais, valores notícia e também periodicidade, tendo em vista que a maioria deles possuem estruturas limitadas e mantêm regimes de publicação variados. 

Esses novos arranjos se constituem então como novos espaços dentro do jornalismo, estruturas de inovação e invenção dentro desse mercado.

E o sucesso alcançado por alguns desses arranjos, tais quais o “Mídia Ninja” e a “Agência Pública” – ambos perfilados pela pesquisa, mostra que há uma multiplicidade de vozes que precisam de veículos jornalísticos, os quais podem melhorar a qualidade da informação que chega até a população.